quarta-feira, 14 de novembro de 2012

espantos, encantos


não sei se com todo mundo funciona assim, mas de vez em quando me pego pensando:
- para onde será que está indo a minha vida, do jeito assim que ando vivendo? onde é que vai dar? VAI DAR?
vou fingindo que não é grave, que é desimportante saber. finjo que o que importa é só o presente, é o que dizem a todo momento. vivo como se fosse mar. sendo intimamente aquário (ora que bobagem, achar que sei com alguma clareza quem sou ou quem deixo de ser!). e como dizer que finjo se o que chamo de fingir tem sido minha mais acostumada rotina? e como confiar em rotina se sou vulcão adormecido, prestes a entrar em erupção a qualquer minuto, dia, ano ou século?
minha natureza é anti-natural: vivo de remexer-me, cutucar-me até que eu possa chegar no oposto ao qual me encontro no momento presente. nada que é retilíneo me diz respeito. me dizem respeito as coisas sem forma, sem motivo, sem destino, tentando harmonizar estética e vivência, claridade e profundidade. Sou eu, a própria coisa disforme, buscando um encaixe (frouxo) que me caiba em aresta e em conteúdo abstrato, denso e líquido - para no momento seguinte descaber.

terça-feira, 9 de outubro de 2012

meu palco

algum dia já vi um mapa detalhado nos meus olhos. sei que quando se começa assim com algum dia, tudo fica muito suspeito de se continuar. melhor seria dizer que nesse momento tenho a impressão de que algum dia já li em mim um mapa, um itinerário muito mais facilmente do que agora. é fácil falar do que não se tem. talvez por isso nosso caminho pareça ser esse sem cansaço buscar que sempre nos fuja das mãos. me espanto (ainda!) por não saber. o próximo passo é urgente? tudo é tão possível que se veste de nada. e paralisa. e clicheriza. tudo é tão possível que dá frio na espinha: a quantos estágios estou do crucial? olho pra dentro mas parece que só encontro respostas no momento presente. nada se projeta nem como cimento nem como nuvem. procuro aspiração para viver, mas só consigo viver vivendo. posso dizer com clareza que a única coisa que tenho é isso: palavras e gestos. também muito sentimento sem rédea. escrever é meu palco. de certa forma me acostumei a errar. mas a gente sabe quando deu um ponto com nó. meu caminho não tem motivo: vive de vontade.

terça-feira, 3 de julho de 2012

sinuca de bico


você olha pra mim e eu perco teu olhar, de propósito: artimanha de retinas, malícia, jogo, trapaça, bola sem caçapa (ou sim).
da forma como digo parece que saio de algum modo vitoriosa, ledo engano. não conseguir suportar teu confronto escópico silencioso me inibe, me apequena, me melancoliza.
sustentar esse seu olhar pra mim arde como brasa, fogo, faca, estaca.
mas não me pergunte porquês: sou tão esparramada que não sei aglutinar motivos, resenhar desejos, dar nós em cordas que fogem de minhas mãos. escapulo, não escapulo.
minha vida é um grande não sei o quê.

domingo, 17 de junho de 2012

nem sal nem açúcar

não é sal nem açúcar, cansei de opostos.
entenda que todo meu interesse está no particular, na sutileza do que é intraduzível.
não é uma fuga, ao contrário, é caminho percorrido na escuta de um desejo. e por isso mesmo tão singular, certeiro, errante.
é preciso ter ouvidos no corpo todo para escutar o que te digo: do contrário é inútil. não é por que eu seja lá qualquer grande coisa, mas se do lugar de onde te falo estou inteira, não me venha cortar as minhas palavras, intenções, comunicações (como se fosse possível!).
sendo clara como o sol te pediria que me visse como oceano e não como um quadro onde há a pintura de um mar. uma pessoa se expõe até mesmo em silêncio. ninguém capta ninguém. mas mantenha aceso seu sincero interesse por mim.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

recado

minha querida,
não tenho nada a te dizer, já que desconfio que só dentro do nosso próprio peito é que nos é possível descobrir qualquer coisa - pista, cor ou sinal - que nos diga sobre a verdade da nossa vida. não me leve à sério quando falo verdade da nossa vida. é uma verdade em mosaico a que me refiro, uma verdade todinha construída e recortada e refeita com os nossos pedaços particulares e plurais, como se fosse possível - e é.  me leve muito à sério quando eu falo verdade da nossa vida, afinal de contas, entre tantos compromissos impessoais, desejos alheios e comodidades suspeitas, é isso que nos cabe quando tudo o mais acaba, quando tudo perde a cor, o sentido, o tino, o gosto, a graça. o que sobra da gente na nossa miudeza encaro como uma espécie de átomo pessoal que nos lembra como é que por algum motivo foi assim que aprendemos a existir.
você aprendeu a existir uma vez, e suspeito com grande intuição que aprenderás a existir quantas vezes forem possíveis, quantas couberem nessa nossa vida longa & curta, quantas vezesinhas teu corpocabeçacoração te pedirem, implorarem, intimarem. honey, não tenho nada a te dizer que não seja: na dúvida, te escuta.

terça-feira, 3 de abril de 2012

quando a necessidade é maior que a inspiração

chove.
já fez sol, já fez sombra, já fez brisa, já fez bruma.
agora chove e chover agora é de uma sinceridade tão grande que vou te contar.
chover agora é de uma transparência, de uma fina sensibilidade.
chover agora é minha poesia pronta, esperando apenas música de fundo - a qual já tateio de antemão.
não é bonito nem feio chover agora.
chover agora sou eu toda, em partes, inteiraçada.
invento essa expressão chover agora para firmá-la no presente: minha vida é esse momento.
ao mesmo tempo ela me lança paraquedas, pois chover agora é agora e depois não era.

segunda-feira, 5 de março de 2012

pessoal e intransferível

um sol lindo daqueles que quase me imagino com uma coroa de flores no meio de um campo bem verde bem grande e bonito estendendo uma espécie de toalha de pano enorme e esvoaçante, aí sem querer você bate na minha perna e me lembro que estoy aqui e agora e tenho que ir comprar flores novas para colocar no vaso vazio - visualizo o VAZIO em letras garrafais toda vez que o olho dentro do vaso - enfim, continuando, comprar flores para colocar dentro desse vazio em cima da mesa pra lembrar a mim mesma que há uma solaridade na vida. e é para lembrar disso que faço coisas como comprar flores, vestir amarelo, beber água de coco e olhar o mar muito longamente. é quase uma infantilidade, um estereótipo, clichê, caricatura, mas que me apego com uma espécie de fé que não tenho com mais nada nesse mundo. e por esse motivo me permito. coloco um vestido florido, um chapéu grande e saio carregando uma sacola, como una camponesa contemporânea, por entre as avenidas e semáforos. sutilmente esse estilo me faz manter a crença de que dará certo - O QUÊ? - não sei, apenas me sinto vez em quando assaltada por esse desejo de acreditar que algo muito importante e vital dará certo para mim. aí cruzo a primeira esquina e uma nuvem escura e insuspeitada começa a despontar em cima da minha cabeça e da de outras pessoas ao redor e a derrubar gotas de chuva lentas que vão se intensificando. me desaponto. me apeguei com o cenário de tal forma. volto pra casa contrariada, não é mais isso que quero, quase melancolizo. ao chegar na porta de casa uma vizinha me oferece uma sombrinha lilás com uns babados nas pontas - surreal - então agora me sinto una completa camponesa em jardim de cimento: vou ali colher as flores.

domingo, 26 de fevereiro de 2012

"nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão"

não é otimismo nem pessimismo
existencialismo ou essencialismo
esoterismo ou materialismo:
tô em outra tão outra que tenho aflição de estar fora do possível.
isso de não ter começo nem fim: porque não me acostumo nunca?
e ao mesmo tempo indago: como ampliar em aresta o que me delimita de antemão?
sou uma anti-aposta.
vivo por essa necessidade de ser alguém que existe e que é:
tudo que eu não escrevo está muito aqui.

quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

meu trabalho é te traduzir

1. só quem tem a insistência e determinação em tentar pode errar tanto.

2. meu coração é um enigma. não é.

3. você sabe ser claro e ser escuro. é certo que prefiro quando és claro, claríssimo, exposto, solar, peito aberto e muito ouvido e palavras. é o lado que mais gosto em você. já se passou o tempo onde eu encontrava amor no mistério. no entanto, há o outro lado. você sabe ser estranhíssimo. daquele jeito ininteligível. ali onde não habitam ainda as palavras. quase um homem das cavernas. você homem da cavernas e eu tentando te traduzir, do lugar de onde vim. tenho um coração sem fronteiras. cavernas não me interessam. vivo a procurar a sutil intersecção entre o meu e o teu desejo. você me escapa mais do que eu gostaria. você é tão escorregadio que não te encontro. você: quem eu quero.

quinta-feira, 19 de janeiro de 2012

ou eu ou poesia

Ponha-se
Não é biografia
Saia-se
De somente nostalgia
Quando digo o que sou
Que seja fantasia
(E se vivo de utopia?)
Pra curar melancolia
Não é chá, é poesia
E olhe lá